quinta-feira, 27 de julho de 2017

A economia e a galinha



Plinio Corrêa de Oliveira25 de Julho de 2017

Sair da prisão e viver em liberdade

Os media vêm tratando das dificuldades que há em passar da economia comunista para a economia privada nos países que estavam submetidos à tirania da URSS. Como o público comum não está habituado aos assuntos económicos, não entende qual é a razão de tais dificuldades. Porque a volta à normalidade traz um pouco de incómodo, mas pode-se, em pouco tempo e com algum esforço retornar a ela, e a vida continua.

Não me levem a mal o prosaísmo da comparação que vou fazer. Quando eu era menino, viajava-se muito de comboio e pouco de automóvel. Quando se chegava a uma estação, via mercadorias serem retiradas do vagão das cargas. Muitas vezes observava descerem jacás com galinhas — eram uns cestos grandes que se usava para transportá-las.

Depois, as galinhas às vezes eram levadas para minha casa e soltas no galinheiro. De vez em quando ia observar o galinheiro. De maneira que ainda conservo a noção das reacções das galinhas saídas do jacá para o período da normalidade dentro do galinheiro. Eu seria capaz, se soubesse desenhar, de traçar o itinerário delas presas no jacá, e depois, colocadas em liberdade.

Em suma: primeiramente a galinha sentia-se livre e olhava um pouco à sua volta, sentindo-se a si própria. Depois, percebia que era possível voltar à normalidade e começava meio a andar desajeitadamente. Em pouco tempo, estava a andar mais depressa e começava a agressão aos vermes para matar a fome. A galinha é anti-ecológica… Em seguida, percebia onde estava a água e bebia, fazendo — não sei por que fenómeno de deglutição — um gesto enérgico com a cabeça. Por fim, saía a andar normalmente. Tinha escapado ao regime de prisão e voltado para o regime de liberdade.

Porque é que a economia de um país não se faz mais ou menos da mesma maneira? Em última análise, para se avaliar esse assunto sob um aspecto mais sério, exemplifico com a Hungria. O país esteve dominado pelo regime comunista durante muito tempo e, em certo momento, começou a liberalizar a economia. Em alguns anos, a economia húngara estava restituída à normalidade. Não foi necessário escrever longos artigos com estatísticas… Foi a marcha natural, como a da galinha retirada da prisão. Assim, também se pode dizer com a economia que sai do regime socialista.

Não compreendo porque é que noutros países que integravam a antiga URSS não se faz o mesmo. Os jornais apresentam tais complicações funambulescas para a normalização da economia, que se fica sem saber se vão encontrar solução. Parece-me que isso representa um desejo dos comunistas de apresentar alguma outra nova fórmula velhaca que represente um comunismo transformado de verme em libélula. Uma metamorfose do comunismo a fim de enganar os ingénuos…









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Excertos da conferência proferida pelo Prof. Plinio Corrêa de Oliveira em 5 de Janeiro de 1992. Sem revisão do autor.





O fim do sexo


Maria João Marques

Somos, machos e fêmeas, biologicamente diferentes. Os cérebros funcionam de forma distinta, as hormonas não coincidem, os órgãos do corpo não são iguais. Quem ignora isto ou é lírico ou é ignorante.

Há uns anos, quando o meu filho mais velho fazia os seus teatros para a plateia familiar, contendo desde avós a irmão mais novo bebé, eu, no papel de apresentadora, era incitada pelo artista circunstancial a expressar-me da seguinte forma: «senhoras e senhores, meninas e meninos, bebezinhas e bebezinhos, apresento-vos etc.». Ofereço-vos isto como prova A de não ser uma cidadã decente e respeitável. Na verdade, sou uma mãe desnaturada, que impõe a todas as minhas relações familiares (incluindo aos meus filhos) esse pesado jugo de se identificarem com um dos dois sexos biologicamente existentes. Foi uma pena não ter existido nenhum benemérito que se infiltrasse nos teatros familiares e me denunciasse à Segurança Social.

Admito, claro, que uma pessoa adulta possa entender não se definir pelo seu sexo e prefira não ter tal identificação nos seus documentos. Evidentemente: cada um veste-se de calças ou saias, mascara-se de spiderman, caranguejo ou centopeia, usa maquilhagem ou não, cabelo curto ou comprido, apresenta-se socialmente com o nome próprio, muda de nome, escolhe um pseudónimo como «lake» ou «pouf», enfim, cada um tem o direito alienável de se apresentar como bem entende perante o mundo. A minha tolerância é tão extensa que nem desrespeito senhoras que se vestem da cor mais enfadonha de todas, azul marinho.

Como os adultos têm todo o direito de decidir o que fazer à sua identidade sexual – conceito diferente de orientação sexual (homo ou hétero), que um homem gay provavelmente tem a sua identidade sexual masculina claríssima, e o simétrico para as lésbicas – não tenho de opinar se recusam identificar-se com um sexo em que não se sentem incluídos. Por isso, a decisão do prestimoso estado americano de Oregon – que já tem felizes residentes cuja carta de condução indica sexo neutro – não me repugna. Não é uma causa que me entusiasme, mas cada qual escolhe como gastar o tempo. Desde que um adulto se responsabilize pelos constrangimentos que essa falta de identificação sexual lhe traz – por exemplo, falta de alguns cuidados de saúde diferentes entre os sexos – e que respeite as outras pessoas, nada tenho a opor.

Em suma: um adulto apresenta-se como entende e identifica-se como lhe aprouver. Mas se impõe aos outros as suas escolhas, o meu mau feitio entra em acção. Não tenho de deixar de ver reconhecida a minha identificação sexual como mulher – de que gosto – para não ferir suscetibilidades dos não-binários, indecisos, trans, dos sexualmente fluídos, ou o que seja. Como as luminárias do metro de Londres decidiram ao abandonarem o inofensivo «ladies and gentlemen». Também não quero ter homens que se sentem mulheres usando as casas de banho femininas – tenho direito à minha privacidade e, até, à segurança. Menos ainda aceito prescindir, e pelas mesmas razões, de casas de banho femininas para passarem a unissexo. Ou, se calhar, melhor, a multissexo (os sexos são como os sistemas planetários, há muitos para descobrir no universo). Recuso que as empresas privadas sejam, para afagar o ego a diletantes, legislativamente obrigadas a oferecerem casas de banho para os sexos que se inventarem.

Piora quando envolve crianças, como o bebé do Canadá de sexo «U». Se um adulto pode decidir para si o que entender desde que não atropele direitos alheios, é, para mim, uma violentação não informar uma criança de parte fulcral da sua identidade: o sexo. Porque a verdade é que somos, machos e fêmeas, biologicamente diferentes. Os cérebros funcionam de forma diferente, produzimos hormonas não coincidentes, os órgãos do nosso corpo não são iguais, as nossas funções fisiológicas ocorrem de modos diversos. Quem pretende que tudo isto é irrelevante, ou é lírico ou é ignorante.

Faz parte do crescimento querermos saber quem somos. Gostamos de conhecer as nossas raízes, as histórias de vida dos nossos pais, de quem herdámos a cor dos olhos e o formato do queixo. É um cliché – mas verdadeiro – afirmar, para um país, que só se entende o presente se se conhecer o passado. As questões identitárias são, por estes dias, galopantes. Os negros. Os sino-americanos. Os gays. Os sobreviventes de abusos e violência sexual. A geração marcada por um evento histórico incontornável (estive alguns anos a estudar e escrever sobre a geração que viveu a revolução cultural chinesa na adolescência). Enfim, tudo é importante para construirmos a nossa identidade. Menos – não se está a ver? – sabermos qual o nosso sexo.

Aos pais de uma criança compete dar balizas para os filhos se construírem. Passar os valores dentro dos quais gostaríamos que vivessem (no meu caso, por exemplo, não dou como comportamento aprovado a participação em genocídios). E, obviamente, informá-los do seu sexo e o que é o seu sexo. Para, também, mais tarde livremente se definirem como dentro do seu sexo ou por oposição ao seu sexo.

O que se vai conseguir com estas maluquices de privação de identificação sexual das crianças? Além de anos em consultas de psicologia e psiquiatria, temo pela frequência da actividade sexual das próximas gerações. É que a maioria de nós gosta de ter sexo ou só com homens ou só com mulheres. De repente, vivermos num mundo onde não conseguimos distinguir se o outro é do sexo que preferimos, não me parece conducente a muitas concretizações sexuais. Quem sabe tornar-nos-emos no Japão, onde um terço da população adulta não tem vida sexual nem pensa ter. Então boa vida de abstinência. Tudo em nome das palermices progressistas.





Católica faz acordo com universidade do aborto


Universidade Católica Portuguesa (UCP)

Secundino Cunha, Correio da Manhã, 25 de Julho de 2017

Católicos contestam acordo
com Universidade de Maastricht
e escrevem ao Papa.

O Vaticano decidiu analisar o protocolo de colaboração assinado pela Universidade Católica Portuguesa (UCP) com a Universidade de Maastricht (Holanda), para a criação de um curso de Medicina, depois de a Congregação para a Educação Católica ter recebido uma exposição, enviada por um grupo de católicos portugueses, em que o acordo é fortemente criticado.

O documento, que já se encontra na mesa de trabalho do cardeal Giuseppe Versaldi, questiona a ligação da UCP a Maastricht, universidade conhecida pelo trabalho em áreas como o aborto e a eutanásia. «Que garantias existem, por parte desta universidade, que não partilha nenhum dos valores e princípios cristãos, de que o ensino ministrado se manterá fiel ao magistério da Igreja?», questionam os católicos, que recorreram ao Vaticano depois de não terem recebido resposta dos bispos portugueses.

O acordo com Maastricht e o anúncio do curso de Medicina «para breve» foram revelados por Alexandre Castro Caldas, director do Instituto de Ciências da Saúde da UCP. O CM tentou um esclarecimento do patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente, que preside o Conselho Superior da UCP, que remeteu para a reitora, Isabel Capeloa Gil.

O assunto deve ser abordado na próxima assembleia plenária da Conferência Episcopal, em Novembro.

Grupo denuncia «jogos políticos»
No processo enviado para Roma, o grupo refere que o acordo entre as universidades tem jogos políticos e ligações à Maçonaria. Dão o exemplo de  um vereador da Câmara de Cascais, entidade que cede terrenos para o polo universitário, estar a tirar um doutoramento em Maastricht.

«É um curso fiel aos princípios da Igreja»
Isabel Capeloa Gil assegura, em comunicado, que o curso de Medicina da Universidade Católica será «fiel aos princípios da Igreja» e que o acordo com Maastricht só tem a ver com o que diz respeito ao modelo pedagógico.

«É um projecto de Medicina que responde e se guia por aquilo que são os princípios da Igreja relativamente à vida, à defesa da vida, ao fim da vida e à dignidade humana», assegura a reitora da Universidade Católica.


SAIBA MAIS

1971
é o ano em que o Estado reconhece oficialmente a Universidade Católica Portuguesa. O decreto Humanam Eruditionem institui a universidade, cuja missão de investigação é completada por uma formação integral inspirada nos valores cristãos.

Maastricht, na Holanda
É uma cidade holandesa, com cerca de 120 mil habitantes. A universidade foi criada em 1976. É uma das mais recentes no país. Tem cerca de 13 mil alunos, dos quais quase metade são estrangeiros.





quarta-feira, 26 de julho de 2017

«Casamento» entre pessoas do mesmo sexo perante a ciência e a ideologia



(Resumo adaptado de um texto de António Justo

Um biólogo aponta para o possível problema de padrastos

O parlamento alemão aprovou o «casamento para todos» independentemente de os pares serem heterossexuais ou homossexuais. Em reacção ao facto, o Prof. Dr. Ulrich Kutschera, focou três aspectos:

1 — o contexto do novo casamento universal com a ideologia do «género»;

2 — a base biológica do ser humano;

3 — e a pedofilia.

Kutschera receia «a pedofilia subvencionada pelo Estado
e grave abuso infantil no futuro».

Segundo ele, no chamado «casamento gay» agrava-se «o problema dos padrastos», o que constitui um risco acrescido para as crianças: um padrasto que vive em casa com uma filha adoptiva, sem ligações genéticas, poderá ter uma maior possibilidade de abuso, embora haja muitos padrastos bons.

Para o biólogo, no chamado «casamentos gay» com filhos adoptivos não existe a herança genética de imunização contra o incesto. Em casamentos, heterossexuais, pai e mãe são em 50% parentes genéticos de seus filhos, e a consanguinidade produz um efeito inibidor do incesto.

A probabilidade de inclinação para pedofilia  é 10 vezes maior em casos de padrastos e de madrastas (estudo de Regnerus M 2012).

Filhos sem pais biológicos sofrem mais de depressões e tornam-se mais frequentemente criminosos e dependentes da assistência social.

Argumenta ainda biologicamente o seguinte:

— «As crianças são moldadas inteiramente pela voz da mãe biológica durante o desenvolvimento pré-natal».

— É «inaceitável uma troca voluntária desta importante pessoa de referência por pessoas estranhas.»

— Na biologia, «sexo» corresponde à reprodução bisssexual (fertilização) enquanto para a ideologia do «género», sexo significa «o desenvolvimento de animais sexualmente maduros».

— A erotização infantil precoce, implementada nos programas das escolas, é inadequada.

O lóbi homossexualista no Estado utiliza
o poder para exercer a sua ditadura.

O Ministro da Ciência do Hesse (Boris Rhein) insurgiu-se contra o professor biólogo Kutschera por este defender que o «casamento para todos» aumenta o perigo de abuso de crianças e pressionou a reitoria da universidade para criticar o professor.

A universidade retorquiu ao ministro com o argumento da liberdade académica e da liberdade de opinião do professor mas, ao mesmo tempo, estando dependente da atribuição de fundos do Estado, distanciou-se de Kutschera.







terça-feira, 25 de julho de 2017

Igualdade de género, ou nem por isso?


Marco Silva

O único princípio que trata todos por igual é o mérito e essa é a cura deste problema intemporal – o das desigualdades de oportunidades.

No dia 23 de Junho deste ano, foi aprovada no Parlamento a lei das quotas de género nas empresas, obrigando empresas públicas e cotadas em bolsa a contratar mais mulheres para órgãos de fiscalização e para os seus conselhos de administração.

Apesar da pompa e circunstância de mais um «momento decisivo na luta das mulheres», como foi  referido por alguns «corvos» políticos, o certo é que nem um mês volvido e esse entusiasmo desapareceu, nomeadamente porque na comissão de inquérito independente à tragédia de Pedrogão Grande foram escolhidos 12 homens e nenhuma mulher, sem que a maioria que tinha aprovado o diploma uns dias antes tivesse esboçado qualquer protesto.

Por falta de mulheres competentes não será certamente, pelo que cumpre perguntar porque se aceita o sucedido. Será que como não é um tacho público/empresarial duradouro já não tem importância a desigualdade? Ou será que o problema é bem diferente e não está a ser combatido?

Curiosamente, foi do PCP que chegou a causa mais aproximada ao real problema quando, ao votar contra a lei, invocou: porque deixa «intacta a mais profunda das causas de discriminações e desigualdades de que as mulheres são vítimas, a exploração da força de trabalho». Embora a explicação do PCP não atinja o cerne do problema, enquadra-o satisfatoriamente. As mulheres, tal como os homens, mas em menor grau, são vítimas da não aplicação da meritocracia. Ou seja, não é pelo mérito que existe a contratação, nem é pelo mérito que é feita a devida remuneração. Esse modus operandi tem um nome, e não, não é machismo, mas corrupção.

É nesta armadilha que caem grande parte dos defensores da igualdade de género, quando erradamente identificam o machismo como o problema e não como o sintoma que ele é, tal como o é o racismo. Todos os actos de preterir alguém por outro motivo que não o seu mérito devem ser tratados por igual, como actos de corrupção, e só com o recentrar do combate será possível termos uma sociedade igualitária, não por decreto, mas por princípio.

Até porque estes actos isolados de «correcção» são os pilares para a perpetuação e branqueamento da corrupção. Senão vejamos, a partir de agora nas empresas públicas teremos cinco homens e cinco mulheres, sem que o princípio primário seja o mérito, o que permite, num país com um elevado índice de corrupção, a colocação de cinco mulheres do aparelho partidário do Governo ou de uma associação de poder.

Na fachada parece existir igualdade de género, contudo, é uma falácia, porque as mulheres, tal como os homens, não têm qualquer estatuto de igualdade perante os que pertencem aos grupos que dominam as instituições nacionais, sejam elas públicas ou privadas. Em suma, não são as mulheres que têm mais oportunidades no novo sistema, mas apenas as mulheres do grupo privilegiado.

E quem fala nas mulheres fala também nos homens preteridos por não terem cartão do partido, ou nas desigualdades de oportunidades dentro do mesmo género, mas de raças ou orientações sexuais diferentes. O único princípio que trata todos por igual é o mérito e essa é a cura deste problema intemporal – o das desigualdades de oportunidades.

Dito isto, uma cultura de mérito não se cria num dia nem numa geração, mas o passo essencial para que tal ocorra é deixarmo-nos de equívocos quanto ao que está realmente em causa. Não é machismo, é corrupção, corrupção que é transversal a todos os géneros e raças. O problema não está no «homem branco», este apenas tem sido o principal prevaricador por uma questão de oportunidade temporal. O problema está em todos os seres humanos que não tenham o mérito como linha orientadora de escolha.





segunda-feira, 10 de julho de 2017

Marques Mendes, o inteligente






Uma experiência do Terceiro Mundo


Alberto Gonçalves, Observador, 8 de Julho de 2017

É gente literalmente abjecta. Perante a tragédia, decretam o caso resolvido. Perante o desleixo, lembram desleixos maiores. Perante as dúvidas, confessam sentimentos. Perante as câmaras, dão abraços.

Em Maio passado, gastei uma quantidade inusitada de tempo a fazer o que nunca faço: reler as minhas crónicas, no caso as que escrevi sobre o actual governo. O propósito era nobre, e prendia-se com a publicação de um livro saído esta semana (pausa publicitária: que mil familiares do dr. César lhe desabem na cabeça se ainda não adquiriu tão magnífica obra). A experiência foi traumática, para dizer o mínimo. Acompanhar a chamada «actualidade», de modo a garantir a coluna no Observador, é convívio mais do que suficiente com os bandos que tomaram conta disto. Não é clinicamente aconselhável reforçar a confraternização.

Os textos em causa, muito menos por mérito do autor do que pelo evidente e portentoso demérito das criaturas que mandam em nós, são premonitórios. Na medida em que as premonições não primam pelo optimismo, são também deprimentes. Desde o primeiro momento, a loucura intrínseca à aliança das «esquerdas», legitimada por um Presidente que o artigo 328.º do Código Penal me impede de comentar, mostrou ao que vinha e para que servia. O impressionante não é que o desastre se tenha confirmado com estrondo, mas que durante ano e meio o desastre se confundisse, para uma notável percentagem da população, com um relativo sucesso. A sucessão de glórias circenses, da bola às cantigas, passando pelo Santo Padre ou pelo Santo Guterres, não explica tudo. A submissão de boa parte dos «media» explica um bocadinho. As benesses do turismo explicam outro bocadinho. A apatia do bom povo e o júbilo das clientelas talvez expliquem o resto.

Certo é que, em poucas semanas, alguma coisa mudou. Não mudaram o circo, os «media», o povo ou as clientelas. Sucedeu apenas que, de repente ou nem por isso, a realidade tornou-se impossível de negar. E a invencível nação que, de acordo com a propaganda, maravilhava a Terra acordou destapada. E feia. Foram necessários dezenas de cadáveres carbonizados e um picaresco (e aterrador) roubo de armamento ao exército para expor, à revelia da maquilhagem e do «spin» e das «boas notícias», a natureza da gente que ocupa o poder.

Não tem sido um espectáculo agradável, excepto para apreciadores da incompetência, do descaramento e da radical ausência de dignidade. É, em suma, uma gente literalmente abjecta. Perante a tragédia, eles decretam o caso resolvido. Perante o desleixo, lembram desleixos maiores. Perante as dúvidas, confessam sentimentos. Perante as câmaras, dão abraços. Perante a culpa, acusam eucaliptos e furriéis. Perante o caos, pedem avaliações de popularidade. Perante a obrigação, partem de férias para Ibiza, a subjugar espanhóis com a barriga e um par de cuecas.

A propósito de Espanha, é revelador que, apesar dos divertidos esforços dos «jornalistas» de cá para os calar, sejam sobretudo os jornais de lá a contar-nos o que o «estrangeiro» vê quando olha para aqui. Vê uma anedota perigosa, um manicómio em auto-gestão, uma experiência do Terceiro Mundo às portas da Europa. E, naturalmente, assusta-se.

O susto não é descabido. Descabido é o rumo que, com a sensatez habitual, o «debate» indígena ameaça seguir. A oposição, se a palavra se aplica, andou uma semana a lamentar o colapso do Estado e a reclamar a demissão dos ministros da Administração Interna e da Defesa e o regresso do dr. Costa. Para quê? Não imagino. A substituição de duas insignificâncias por duas insignificâncias iguaizinhas não alteraria nada. O prolongamento das férias do dr. Costa por 20 ou 30 anos alteraria imenso. Quanto ao Estado em frangalhos, em teoria só um socialista, assumido ou dissimulado, se maçaria com o tema – na prática, o aborrecido é a devastação principiar pelos únicos pedaços que, se calhar, convinha manter.

Entre o chinfrim, sobra um facto: Portugal é governado por uma coligação de leninistas com sentido de oportunidade e de oportunistas com nostalgias totalitárias. O que nos está a acontecer é o percurso fatal em qualquer arranjo do género. Começa-se em euforia, avança-se para a estupefacção, saltita-se para a raiva e termina-se em desgraça, porque semelhante malformação não poderia terminar de maneira diferente. O simbolismo da recente manifestação de apoio ao sr. Maduro, em Lisboa, não é desprezível.

No mesmo dia em que os funcionários da ditadura atacaram com marretadas pedagógicas o parlamento venezuelano, o Conselho Português para a Paz e Cooperação, uma excrescência do PCP, desfilou a regozijar-se com o sangue das vítimas. Na homenagem, participaram, cito, «representantes da câmara municipal de Lisboa» e, quiçá em celebração de Tancos, a Banda do Exército. Segundo o «Diário de Notícias», o belo evento «foi perturbado por um incidente com um cartaz». O cartaz rezava «Venezuela Livre», e o portador acabou devidamente assaltado em prol da paz e, claro, da cooperação.

Portugal não está nas mãos de irresponsáveis, tradição a que aliás nos habituáramos: está nas mãos de criminosos, por acção ou omissão. São eles que, a cada calamidade, juram que podia ter corrido pior. E, no que depender deles, há-de correr.





sábado, 8 de julho de 2017

Agenda Transgénero vs. Ciência


Rick Fitzgibbons, Actualidade Religiosa, 5 de Julho de 2017

O Gabinete para os Direitos Civis do Departamento de Educação dos Estados Unidos emitiu recentemente uma série de instruções que indicam que se uma escola não utilizar os «nomes e pronomes escolhidos» pelos alunos transgénero, incorre em assédio.

De acordo com esta instrução da Administração Trump, o assédio inclui:

«Actos de agressão verbal, não-verbal ou físicos, intimidação ou hostilidade com base no sexo ou estereótipos sexuais, tal como a recusa em usar o nome ou o pronome escolhido por alunos transgénero quando a escola os usa para alunos não-transgénero ou quando a recusa é motivada por animosidade para com pessoas que não se encaixam em estereótipos sexuais».

Esta ameaça dirigida a professores, auxiliares e directores aumenta o risco de danos psicológicos e físicos/cirúrgicos para jovens e ignora completamente a literatura médica e psicológica sobre os factores de risco grave associados à criação de um ambiente favorável a que jovens se identifiquem com um sexo diferente daquele que é determinado biologicamente por cada célula do seu corpo.

A Administração Trump devia recuar destes artigos de fé politicamente correctos da administração anterior e examinar cuidadosamente, através do estabelecimento de um grupo de uma comissão presidencial, caso seja necessário, a ciência médica e psicológica associada com as tentativas de ajudar os jovens a lidar com atracções transexuais.

Os membros desta comissão poderiam incluir o Dr. Lawrence Mayer, professor de estatística e bio-estatística na Arizona State University, que se assume como um liberal e apoiante dos direitos LGBTQ e o Dr. Paul McHugh, que foi psiquiatra chefe da Universidade John Hopkins entre 1975 e 2001.

O artigo destes dois cientistas de 2016, «Sexuality and Gender: Findings from the Biological, Psychological and Social Sciences», é uma revisão exaustiva da literatura científica sobre identidade de género e orientação sexual, no qual examinaram mais de 500 artigos científicos. Ambos os médicos concordam que nem a orientação sexual nem a identidade de género é inata ou imutável (ou seja, ninguém nasce homossexual nem transgénero, ambos são fluidos). Mais, nem um nem outro encontrou qualquer prova de que se devia encorajar as crianças a identificarem-se como transgénero.

O Dr. Paul Hruz, um endocrinologista e professor associado de biologia celular e fisiologia na Washington University School of Medicine, de St. Louis, liderou um estudo de investigação chamado «Growing Pains: Problems With Puberty Suppression in Treating Gender Dysphoria» que levanta sérias questões sobre a forma como se tratam actualmente as crianças que padecem de disforia de género.

Esse relatório afirma que:

«Particularmente importante é o tratamento de crianças com disforia de género. Jovens com disforia de género constituem um grupo particularmente vulnerável e sofrem de altas taxas de depressão, automutilação e até suicídio. Acresce que as crianças não são ainda inteiramente capazes de compreender o que significa ser-se homem ou mulher. A maioria das crianças com problemas de identidade de género acabam eventualmente por aceitar o género associado ao seu sexo e deixam de se identificar com o sexo oposto.»

O artigo diz ainda que «à luz das muitas incertezas e do desconhecimento existente, seria apropriado descrever como experimental a utilização de tratamentos para bloquear a puberdade em crianças com disforia de género». Este novo tratamento tem sido oferecido a jovens sem as habituais salvaguardas que acompanham as terapias experimentais, tais como testes clínicos cuidadosamente controlados e estudos de seguimento a longo prazo.

O Dr. Kenneth Zucker, autor e psicólogo clínico, é outro académico importante e reconhecido internacionalmente no campo da disforia de género que seria um membro valioso de uma comissão presidencial sobre a forma mais apropriada de tratar estes jovens em termos médicos. Há trinta anos que ele trabalha neste campo e tem escrito uma quantidade enorme de artigos em revistas académicas sobre as origens e o tratamento dos muitos conflitos psicológicos em pais e jovens que dão aso a atracções transgénero. É co-autor do livro «Gender Identity Disorder in Children».

Os artigos do Dr. Zucker descrevem a forma como ele ajudou muitos jovens a aceitar a sua masculinidade ou feminidade biológica. O seu grupo só recomenda intervenções médicas quando a psicoterapia não funciona. Um recente documentário da BBC «Transgender Kids: Who Knows Best?» apresenta o seu trabalho e a controvérsia que actualmente rodeia as abordagens a jovens com atracções transexuais.

Os jovens e os seus pais têm direito ao consentimento informado sobre a atracção transexual, incluindo as opções de tratamento disponíveis, o facto de haver remissão na maioria dos casos e os riscos psicológicos e médicos graves associados ao uso experimental de hormonas e à cirurgia transexual.

Dois dos estudos mais importantes que devem ser discutidos dizem respeito aos efeitos da cirurgia transexual. Um estudo de 2015 determinou que num grupo de 180 adolescentes transexuais (106 mulher-para-homem e 74 homem-para-mulher) o risco de desordens psiquiátricas, incluindo depressão, ansiedade, ideias suicidas, tentativas de suicídio, automutilação sem intenções letais e tratamentos por saúde mental tanto em internato como em ambulatório era duas ou três vezes superior do que no grupo de controlo (Reisner, S.L., et al., 2015).

O maior estudo sobre transexuais pós-operatórios foi uma análise de mais de 300 pessoas na Suécia, ao longo dos últimos 30 anos. O estudo demonstra que depois de operações de mudança de sexo as pessoas incorrem em riscos de mortalidade, comportamento suicida e morbidade psiquiátrica consideravelmente superiores à população em geral (Dheine, C., et al. 2011).

Se o filho do Donald Trump lhe dissesse que se sentia uma mulher presa no corpo de um homem, o Presidente certamente quereria que ele tivesse conhecimento de todos os dados científicos associados a estas atracções emocionais e pensamentos confusos e ilusórios. E certamente não quereria que os professores e conselheiros seguissem as orientações do Departamento de Educação que promovem esses pensamentos ilusórios e sugerem tratá-lo por ela.

É urgente a criação de uma comissão presidencial que aborde esta pressão altamente politizada para se aceitar a agenda transgénero, para melhor proteger os jovens, as famílias e a cultura. Entretanto estas orientações draconianas que ignoram totalmente a ciência psicológica e colocam os jovens em risco deviam ser imediatamente revogadas.







sexta-feira, 7 de julho de 2017

«No tempo de Salazar, os ministros mandavam nos ministérios»




ENTREVISTA AO GENERAL GARCIA LEANDRO
SOBRE OS ACONTECIMENTOS NO EXÉRCITO.
(PEDRO RAINHO, OBSERVADOR)

(EXCERTOS)

O general Garcia Leandro diz, em entrevista ao Observador, que se o CEME avisou o ministro da falta de segurança, a culpa é do ministro. Se não o fez, a responsabilidade é dele.

general Garcial Leandro, 77 anos, foi vice-Chefe do Estado-Maior do Exército, conselheiro de Portugal na NATO, comandante da missão das Nações Unidas no Sahara Ocidental. Uma das lições que aprendeu na sua longa carreira militar explica-se assim: a missão cumpre-se sempre, até se pisar a linha vermelha. No assalto ao armamento de guerra de Tancos, essa linha foi ultrapassada quando se encarou como «rotina» uma fragilidade na segurança que esteve dois anos para ser resolvida e que abriu a porta ao furto do armamento. Se tem um responsável em mente para o que se passou no parque de paióis de Tancos, Garcia Leandro não assume, mas diz: «Se o CEME alertou o ministro para as consequências graves que esta situação tinha, o responsável é claramente o ministro. Se não alertou, a responsabilidade é dele.»

— Dizer que tem havido outros assaltos do mesmo género que o de Tancos em países como França ou Estados Unidos retira alguma gravidade ao que se passou na semana passada?

— Não, para mim, não tira. O que se passou em Tancos é uma coisa, o resto é outra. Com o mal dos outros estou eu bem.

— Então de que serve este argumento usado pelos responsáveis políticos?

— Existe para dizer que não é caso único, mas o que me preocupa é este caso, este país, com todas as consequências que isso tem em termos de segurança para as populações e para a imagem do país no exterior.

— Está-se a dar demasiada importância ao que aconteceu em Tancos?

— Não, não está. Isto é muito grave.

— Já disse que isto não podia ter acontecido.

— Não podia. A segurança nos depósitos de material de guerra sempre foi uma das preocupações das autoridades militares. Os paióis sempre foram uma grande preocupação. Isto é algo que nunca aconteceu na minha vida. Por todos os sítios por onde andei em guerra e, sem ser em guerra, em missões internacionais… Para uma coisa destas são precisos lapsos, asneiras, limitações grandes de meios.

— O que revela este assalto?

— A minha abordagem não tem nada de corporativo ou pré-partidário, não tem pré-posições a esse respeito. É só uma questão de interesse nacional e de avaliar o que se deve fazer para correr bem. Há aqui três ou quatro aspectos enquadrantes. Um deles é a cultura militar, que é fazer sempre a missão, mesmo com cortes de meios. Imagine: tem um orçamento de 100 mil euros e faz a missão. Cortam 10 mil, faz. Cortam mais 10 mil e faz. Até que a casa cai. A cultura é tentar sempre cumprir a missão.

— Sempre?

— Há momentos em que, como avisei várias vezes, a casa pode cair, o castelo de cartas vai abaixo. Há uma linha vermelha que não se pode ultrapassar.

— Neste caso, foi passada a linha vermelha?

— Isto já vem de trás, é um acontecimento que não se esperava. Acontece também que, do ponto de vista do sistema de Governo, houve uma grande alteração. Mesmo no tempo do professor Salazar e de Marcelo Caetano, os ministros mandavam nos ministérios. Tinham muito ou pouco dinheiro, mas o ministério era piramidal. O ministro estava no topo e tinha o seu dinheiro. De há 15 anos a esta parte, com a evolução da tecnologia e com a necessidade de controlar as finanças, o Ministério das Finanças entra, transversalmente, nas direcções gerais todas. Entra, corta, tira e põe. Os ministros não mandam, têm uma falta de poder muito grande. Até pode haver uma grande compreensão daquilo que são as necessidades da sua área, mas têm de negociar isso com o Ministério das Finanças. As Finanças têm uma acumulação de assuntos que, tendencialmente, fazem paralisar a máquina e, por outro lado, obrigam os ministros a negociar caso a caso. É um drama permanente.

— Essa intervenção das Finanças deve ser limitada?

— Há assuntos, tais como a segurança nacional que não podem ser tratadas dessa maneira. Não estamos a falar de ter ou não ter papel A4.

— Isso exige que na tutela esteja um ministro com poder político.

— Tem de ter poder político e compreensão, não pode ter uma posição em que diz que está ali para dar ordens. (...)

(...)

— Estávamos a falar de linhas vermelhas. Como é que esse princípio se aplica ao assalto a Tancos?

— As chefias militares das Forças Armadas têm missões para cumprir e essas missões têm de ter meios, uma estrutura, orçamento, pessoal. Na questão dos paióis, o que se passou é que, no tempo do dr. Aguiar Branco, o corte de meios em pessoal, em finanças e em material foi muito, muito, muito grande. As unidades ficaram muito reduzidas de meios, nomeadamente humanos.

— Ao ponto de já não se poder cumprir a missão?

— Isso não sei responder. Mas alguém há-de saber responder a isso. Este Governo ainda não conseguiu inverter isso. Agora, temos de ter a noção de que vivemos num tempo de paz e de calma, mas o mundo não vive. Nós estamos aqui relativamente tranquilos mas o mundo não está. Temos de estar preparados para qualquer situação de imprevisibilidade em que tenhamos de responder no âmbito da segurança nacional, da segurança na aliança Atlântica, em que temos o nosso papel, dentro da UE, dentro da CPLP, dentro da ONU e queremos sempre tomar parte disso. Mas não podemos fazê-lo deixando o interior do país, as ilhas e o mar completamente desprotegidos. Quando chegamos à questão dos paióis, a localização daquela estrutura obriga a que tenha uma segurança óbvia, até porque é a zona onde há mais meios militares. Se os meios militares baixarem até um determinado nível, a partir de certa altura não se pode garantir a segurança.

— Os dados que foram conhecidos indicam que a segurança naquela infraestrutura estaria a cargo de 10 militares.

— Mas não foi sempre assim, já foram 30. E 30 não é a mesma coisa que 10, independentemente da videovigilância, porque em 1980 não havia videovigilância. Mas o mundo também era diferente. Isto de se fazerem assaltos a estes locais não existia.

— Portugal não acompanhou essa evolução em termos de segurança?

— Por um lado, tivemos os cortes no orçamento e no pessoal. Por outro lado, tínhamos o sistema de videovigilância que estava obsoleto e ia ser substituído. Onde é que está a falha? A falha está em dizer que determinado equipamento não está em condições, que esse equipamento é vital e não pode ser sujeito à rotina da burocracia.

— Não se pode esperar dois anos para intervir…

— Tem de ser já. E aí é que o chefe militar tem de dizer que não se responsabiliza e perguntar ao ministro se assume a responsabilidade. Tem de dizer que não tem condições para fazer a segurança. Normalmente, quando as coisas são postas assim, a resposta é positiva. As pessoas não querem ficar com a responsabilidade em cima. Mas, historicamente, não são os ministros que ficam com a responsabilidade em cima, são os generais e os almirantes. Situações de grande responsabilidade não podem ser tratadas como situações de rotina, são situações excepcionais e não podem ter uma decisão de rotina.

(...)

— O comandante do Exército não deve ter essa capacidade independentemente das circunstâncias?

— Tem. E tem de avisar: «Olhe que a partir de agora não garanto a segurança disto.» E admito que tenha avisado. Agora, não sei de quem é a responsabilidade.

(...)

— Fica a sensação de que está tudo refém dos inquéritos. Não há tomadas de posição pessoais sobre as falhas, não se assume responsabilidade e não se tiram consequências se não houver um inquérito que atribua essa responsabilidade.

— O CEME acha que estava a fazer o melhor que podia com a segurança dos depósitos de material de guerra. Não tenho dúvidas de que isso é verdade, mas dentro de uma linha de rotina. Não numa linha de situações excepcionais. Nessa linha de situações excepcionais, não respondeu. No mecanismo de pensamento militar, em todas as situações têm de se ver as hipóteses, as chamadas modalidades de acção: qual é a modalidade mais perigosa e qual é a mais provável. Neste caso dos paióis, tinha de se fazer um cuidadoso misto. Julgo que nunca acreditaram na possibilidade de aquilo ser assaltado. Porque se tivessem acreditado o esquema montado teria sido diferente.

— O senhor tem um responsável identificado, só não quer apontá-lo.

— Pode deduzir isso do meu pensamento, mas eu não sei qual é o responsável. Porque se o CEME alertou o ministro para as consequências graves que esta situação tinha, o responsável é claramente o ministro. Se não alertou, a responsabilidade é dele.

(...)

— António Costa tem de intervir directamente neste processo?

— Ele está no topo do executivo.

— Em Setembro morreram dois instruendos do curso de Comandos e, nesse momento, o CEME não suspendeu nem exonerou qualquer responsável militar. O CEME devia ter agido?

— Não lhe sei dizer porque a estrutura do regimento de Comandos obriga a vários patamares de responsabilidade. Pode ter acontecido que ao nível do comando tudo tenha sido bem feito e tenha sido mal executado por outras pessoas. Nestas forças especiais, existe gente muito nova cheia de vontade de fazer coisas e que depois exagera.

(...)

— Tancos não é a única infra-estrutura com elevado grau de sensibilidade. Há outros pontos em que a segurança possa estar comprometida e para que se deva olhar?

— Julgo que não é a minha opinião que conta. Julgo que isso é imediato. Assim que isto aconteceu até o senhor ministro se envolveu e disse que tinha de ser feita uma fiscalização cuidadosa noutros paióis. No que respeita à dimensão e importância, os maiores são os de Santa Margarida. Existe um depósito de material NATO, na margem sul, mas é da NATO.

— O assalto a Tancos teve grande repercussão internacional. A imagem do Exército fica fragilizada com este episódio?

— Acho que sim, o próprio CEME disse isso.

(...)

— E não podemos ficar a perder na relação com os parceiros da NATO, parceiros europeus, etc.?

— O facto em si é muito mau, mas daí a tirar consequências gerais para o futuro não creio que possa acontecer.

— Que lição se deve tirar de tudo isto?

— Nunca deixar passar a linha vermelha. É bom não esquecer isto: quem fica sempre com a responsabilidade são os chefes militares. Os políticos passam, mudam, vão fazer outra coisa, até podem ser substituídos, mas não ficam com a responsabilidade. O chefe militar tem de ter o cuidado de não deixar entrar estas situações em incapacidade de cumprimento.

— Fazendo esse alerta, e não havendo a tal resposta por parte do poder político de que falava, o chefe deve sair?

— Isso tem de ser analisado caso a caso, pessoa a pessoa. Alertando, conforme a gravidade da situação, então deve dizer que não contem mais com ele.

(...)